quarta-feira, 1 de outubro de 2014

Quem há de lembrar da pátria amada quando tocarem em seus pertences?
Quem há de levar os filhos à escola quando descobrirem que não são seus?
Quem há de se sentir culpado quando o irmão é criminoso hediondo?
Quem há de vender a alma para Lúcifer se já nasceu sob pé-direto alto?

Quem há?

As respostas são sempre paliativas.

Quem há de conotar para conquistar a mulher amada?
Quem há de denotar para conquistar a riqueza desejada?

Seremos todos ou seremos um?

Quantos?

Quem há de seguir ambições egoístas em busca do bem comum?
Quem há de se enganar para alcançar prazer legítimo?
Quem há de almejar a narrativa perfeita?

As respostas são sempre paliativas.

Durmo e acordo outro.

Quem há que nunca mais dormiu?

quinta-feira, 22 de maio de 2014

O Môr

Quê me traz o artesão
de sonoridade inusitada?
Face multifacetada?
Ilusão de ótica viu.
Enganara-se: "pouco importa".

Lascou-lhe a boa risada.
A maxila flexionada.
Do prazer simples,
fez-lhe deleite demente.
De certo, corrente.
Acabou que nem viu.

Passatempo universal.
Fina pastilha mental.
Consolou piratas e prisioneiros.
Poliglotas e cancioneiros.
Por certo, democrata.
Da base ao cume, nutriu.

Matéria bruta social.
Simpatia sintética e real.
Vadia por qualquer fresta
sempre bem [mal] recebida
por quem vive e,
acima de tudo,
ama [odeia] viver.

domingo, 27 de abril de 2014

Fugaz

Um refém do pensamento intuitivo.

As ideias vem, entorpecem, e se vão.

Deixam rastros de compreensão.

Um aroma leve, amadeirado, de entendimento.

Desvanecimento ligeiro, uma pena.


Que desperdício de transmissão.

Incapacidade de concatenação.

Deixa a humanidade orfã de belas ideias.

Uma realidade egoísta,

apesar de legítima.


Não me culpo mais.


Aliás, tento nunca culpar.



segunda-feira, 17 de março de 2014

Ode Nutricional

Que nova substância está na moda?
Seriam gotas de quinoa ou
pitadas de açaí?

Quantas moças vi
endurecendo aqui e ali?

Na alameda da saúde
andarão todos em
linha reta.

Que homens nus alcançarão
o Olimpo - sonhada meta?

De estrofes e parágrafos
sorviam apenas detalhes
corporativos.

Quantos trouxas viverão
ociosos, inativos?

E ornado de groselha,
tal sal grosso e
tal picanha.

Viveu um gordo o qual,
dessa vida, pouco ganha.

segunda-feira, 10 de março de 2014

Das anunciações sem fôlego

Não soube vender
sua ideia
e foi para casa.

Solitário.

Soubera não crer
no passado
e foi escutado.

Apóstolo.

Não soube cuspir
no mendigo
e foi aplaudido.

Político.

Soubera não ser
da tendência
e foi esquecido.

Anacrônico.

quinta-feira, 6 de fevereiro de 2014

Meu Museu

E devo reiterar minha proposta de um entendimento fluido.

Um misto de filosofia e poesia. Uma nova poética de possibilidades diversas. Um bastião da liberdade psicológica. 

Um palavreado escorregadio, pronunciado por línguas sagazes e fugazes. Um sentido volátil, que deixa apenas um aroma de compreensão.

Quem são vocês que querem a concretização do aprendizado?

Quem são vocês que não veem o pensamento com uma nova forma de sentir?

Permitir-se saber é se permitir sentir.

Abandonar as noções brutas, os pesos desnecessários, os pianos vertebrais e as hérnias de disco torto.

Dar asas a neurônios carnavalescos, suspiros desenfreados e análises supérfluas. 

Ter a compreensão como forma de arte. 

Essa é a ordem do dia.

Vou dormir reconfortado com a possibilidade de um museu para chamar de meu.

Só meu. 

quarta-feira, 5 de fevereiro de 2014

Feudo

De terras, a fé dispunha.

Das covas, a moral se opunha.

Em vão.

Ou não?


Só Deus sabe.

terça-feira, 28 de janeiro de 2014

Glutão

Esfomeado e faminto, vejam só, o Glutão habitava a palácios dourados.

Quanta sede de uvas verdes, quanta sede de uvas nobres...

Embriaga-te de paixão, ó Glutão, que és flácido e incapaz de amar!

E na flacidez ele se permitiu viver. E da flacidez ele se permitiu amar.

Quem era o Glutão, que a este palácio veio a habitar?


E por terras derretia sua graxa perolada,

E por terras não vivia sua fome desejada.

Apenas por mesas de feudos e deuses,

Apenas por camas de musas e damas.


Ó Glutão, quem és ti, cuja alma sempre foi enfastiada...

terça-feira, 21 de janeiro de 2014

Torno

O cotidiano embruteceu sua alma.

Tornado frio e cinzento pela repetição do imperativo econômico, desaprendeu a ler poesias. De sua memória desvaneceram os pensamentos mais coloridos, as prosas mais deliciosas, as palavras mais sedutoras...

Tornado profundo em linhas retas demais, um geômetra cartesiano descasado das belas formas curvilíneas.

Pois entendam, meus caros, que a beleza está na curva. Na linearidade, apenas a certeza.

Mas somente o caos é certo.

Tornado caótico pela delongada continuidade da tarefa, ousou ousar em um mundo descontinuado. Ousou se permitir viver cambaleando.

Tornado trôpego em palavras moles, esteve certo de que uma vida linear era apenas uma possibilidade teórica.

Um advento literário.

Como tudo.